Capa do álbum ‘A explosão musical dos Fevers’, de 1971 — Foto: Reprodução
♪ MEMÓRIA – Ano de consagração e confirmação de ícones da MPB, mestres do samba e pioneiros do soul nacional, 1971 marcou também a ascensão nas paradas nacionais do grupo carioca The Fevers, cuja entrada em cena de forma profissional, em 1965, coincidiu com a implantação do reino da Jovem Guarda.
1971 foi ano especial na trajetória do conjunto. Tanto que a banda – então um septeto formado por Almir Bezerra (voz e guitarra), Cleudir Borges (teclados), Lécio do Nascimento (bateria), Liebert Ferreira (baixo), Luiz Claudio (voz), Miguel Plopschi (saxofone) e Pedro da Luz (guitarra) – gravou e lançou nada menos do que dois álbuns ao longo de 1971.
Ambos os LPs foram editados pelo selo London, associado à gravadora Odeon. O primeiro, The Fevers, chegou ao mercado fonográfico em maio daquele ano de 1971 e galgou as playlists da época no embalo do sucesso da faixa Mar de rosas, versão em português – escrita por Rossini Pinto (1937 – 1985) – de (I never promissed you a) Rose garden (Joe South, 1967).
O segundo, A explosão musical dos Fevers, saiu em novembro de 1971 e confirmou o título, estourando várias músicas nas rádios (e nos programas de TV mais populares) e vendendo mais do que todos os oito álbuns anteriores do conjunto. Não por acaso, ao dar sequência à discografia em 1972, os Fevers já tinham sido incorporados ao elenco da gravadora Odeon.
Gravado nos estúdios cariocas da Odeon de 21 de setembro a 7 de outubro de 1971, sob direção artística de Milton Miranda, A explosão musical dos Fevers foi álbum extremamente fiel à essência desse grupo criado e vocacionado para animar os bailes com repertório que, nos discos, sempre incluiu versões em português de baladas e pop rocks estrangeiros, além de covers de sucessos internacionais.
A diferença é que, na safra do álbum A explosão musical dos Fevers, as músicas inéditas começaram a ganhar espaço e fãs.
Aliás, cabe ressaltar que, dos dois grandes hits legados pelo álbum para a posteridade, um foi a tristonha balada Ninguém vive sem amor, composição da lavra do vocalista do grupo, Almir Bezerra, cujo canto doce e afinado era uma das marcas mais fortes dos Fevers na fase inicial desse grupo originado da convivência do baixista carioca Liebert Ferreira Pinto com o guitarrista baiano Evangivaldo de Souza Pedro da Luz (1945 – 2013), o Pedrinho, em Piedade, bairro carioca onde os músicos viveram a adolescência como garotos que amavam mais os Beatles do que os Rolling Stones.
Após rápida passagem pelo circuito fluminense de bailes, quando o grupo ainda se chamava The Fenders (o nome original era Conjunto Young), Os Fevers iniciaram carreira na indústria fonográfica como a banda arregimentada para tocar em discos do grupo Golden Boys e do cantor Eduardo Araújo em atividade iniciada em 1965.
Contudo, o grupo jamais conseguiu se impor para valer enquanto vigorou o reino da Jovem Guarda. A ascensão do conjunto começou de fato em 1969. Com carreira fonográfica iniciada em 1966 com a gravação de single duplo, o grupo já contabilizava cinco anos de disco quando estourou com os dois LPs de 1971, sobretudo com o álbum A explosão musical dos Fevers.
Além de Ninguém vive sem amor, canção de melodia simples e sedutora que seria regravada por Fafá de Belém após 18 anos para o álbum blockbuster Fafá (1989) com arranjo evocativo do registro original dos Fevers, o grande hit do LP foi Vem me ajudar.
Trata-se de versão em português – escrita pelo recorrente Rossini Pinto – de Get me some help (Daniel Vangarde e Nelly Byl, 1971), sucesso do cantor espanhol Tony Ronald (1941 – 2013) naquele ano. Faixa expansiva, Vem me ajudar diluiu a sofrência com a pegada dançante das músicas dos bailes, uma das características da banda.
Metade das 12 músicas do repertório do álbum A explosão musical dos Fevers foi composta por versões, todas escritas com a habitual fluência pop de Rossini Pinto, compositor dominante nos créditos do LP. Até porque, além das versões, Rossini foi parceiro de Almir Bezerra e do então saxofonista Miguel Plopschi (músico que galgaria postos na indústria fonográfica como executivo de grandes gravadoras) na canção De que vale tanto amor? – outro exemplo de como Os Fevers sabiam embalar a tristeza com alegria pop – e coautor de A espera e de Não é verdade, músicas também creditadas a Plopschi e ao tecladista Cleudir Borges.
Como Os Fevers atuavam essencialmente em bailes, um cover-xerox como o de Oh me oh my (Jim Doris, 1969) – sucesso da cantora Lulu que havia sido hit no Brasil no ano anterior na voz do cantor norte-americano B.J. Thomas (1942 – 2021) – cabia no repertório do disco.
Mix de hit de baile com rock à moda da Jovem Guarda, Já sei de tudo – versão em português de Susan’s tuba (Graham Gouldman e Ritchie Cordell, 1970), hit do grupo Freddie & The Dreamers – traduziu bem o espirito jovial da música dos Fevers. Assim como Nathalie (1970), tema do cantor George Baker propagado pelos Fevers no disco em versão em português do incansável Rossini Pinto.
Na versão dos Fevers, Nathalie marcou presença nas rádios brasileiras da época, assim como Sou feliz, outra versão, esta de Igual que ayer, igual que antes (Aníbal Conte e Carlos Iturbide 1971), hit do trio argentino Galetta.
Já Pro que der e vier – um rock à moda da Jovem Guarda com toque de soul – tocou bem menos, mas ficou para a posteridade pela curiosidade de ser parceria do soulman Hyldon de Souza (então ainda no grupo Os Diagonais e a dois anos de debutar na carreira solo com single gravado em 1973) com Pedro da Luz.
Ouvido 50 anos após o lançamento, o álbum A explosão musical dos Fevers conserva viço pelo perene apelo pop de versões de hits como Barbarella (Fred Jay, Ralph Siegel Jr. e Oliver Freytag, 1968) – música-tema do homônimo estrelado pela atriz Jane Fonda – e One night stand (Hammond e Haziewood, 1970), que virou Você não viu na pena firme de Rossini Pinto.
Por esse brilho pop, a explosão fonográfica dos Fevers em 1971 ainda ecoa na mente dos seguidores desse grupo que ainda se mantém atividade, se alimentando do passado que lhe rendeu sucessos nos anos 1970 e 1980.
Fonte: Mauro Ferreira G1 POP&ARTE