Hyldon, que ao lado de Tim Maia e Cassiano formaram a Tríade da Soul Music Brasileira, fala do novo trabalho e da carreira com exclusividade!
Reportagem e fotos por Elias Nogueira
Hyldon de Souza nasceu 17 de Abril de 1951 em Salvador (BA). Quando se mudou para o Rio de Janeiro, antes morava até os sete anos de idade em Senhor do Bonfim na Bahia – nesta época trocou um relógio que ganhou em seu aniversário por um violão. Ironia do destino: Hyldon nunca mais usou relógio e não largou mais o violão.
Em 1965, influenciado pelos Beatles e incentivado pelo seu primo Pedrinho da Luz (guitarrista do The Fevers), Hyldon montou uma banda chamada “Os Abelhas” formada por jovens da sua idade – fez muitos bailes em clubes de Niterói e cidades vizinhas, tocou em programas de rádio do Paulo Bob e até na televisão no programa A Festa do Bolinha do Jair de Taumaturgo, na extinta TV Rio.
Quando Hyldon estava empolgado com os caminhos que a sua vida estava tomando, sua mãe decide voltar para o interior da Bahia. Hyldon então com 16 dezesseis anos, sua mãe concordou em deixá-lo com a condição de que ele só ficaria no Rio de Janeiro se fosse morar com seu primo Pedrinho. Dito e feito, Hyldon passou a acompanhar o primo em todos os lugares.
Hyldon começou a ser reconhecido também como compositor gravando várias canções com Jerry Adrianni, Wanderley Cardoso, Wilson Simonal, Gerson Combo, Tony Tornado, Pedro Paulo, Elizabeth, Adriana, The Fevers, Rosa Maria, Carlos José etc.
Hyldon teve seu primeiro e maior sucesso em 1975, com a balada emblemática “Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda”, título de seu primeiro disco, que ainda estourou “Na Sombra de uma Árvore”, “As Dores do Mundo”, “Sábado e Domingo”, “Acontecimento”, e “Vamos Passear de Bicicleta”. Em bate papo Hyldon falou do novo trabalho e da carreira.
O começo.
– Comecei a tocar com meu primo Pedrinho da Luz, dos Fevers. Sempre o acompanhei, era garoto quando aprendi a tocar violão. Quando começou o lance de rock, as guitarras eram feitas a mão, e a primeira guitarra do Pedrinho foi feito com o braço do meu violão. O pessoal da banda me dava os instrumentos que eles deixavam de usar, já que ganhavam instrumentos de uma marca que estava surgindo na época, era mais ou menos em 1968 ou 1969. Quando eu estava com 16 anos, minha família voltou para Bahia. Estava com um conjunto de baile, Os Abelhas. Como eu andava com meu primo e freqüentava muitos lugares… CBS, Odeon e, conhecendo várias pessoas, consegui gravar minha primeira música “Eu me Enganei’ com Robert Livi.
Livi havia estourado com a música “Teresa” e “Parabéns pra você”. E “Eu me enganei” chegou a ser lançado no LP “As 14 mais” da CBS.
Um dia de gravação dos Fevers, na Gravadora, havia faltado um guitarrista de base que era o Almir, era tudo ao vivo. Alguém sugeriu que eu o substituísse, desde então eu passei a ser o regra três. Fiquei muito na coisa de Jovem Guarda. Em 69 comecei a compor algumas coisas com Pedrinho que foram gravadas por Wanderley Cardoso e Jerry Adriani.
Os Diagonais? Você cantou na banda?
– Eram Cassiano, o irmão Camarão e Amaro que era o solista. Para você ter uma idéia, quem gravou “A Turma da Pilantragem” foi Os Diagonais, era um lance do Carlos Imperial. Eu nunca cantei nos Diagonais, isso é informação errada, é lenda! Em 1969 Os Diagonais me convidaram para fazer uma viagem para o interior, para faturar um dinheiro. Eu tinha um Fusca e fomos. Eu, eles três e o Maurício que era motorista de ambulância do INPS. Neste período montamos um show e eu dividia guitarra e baixo com Cassiano.
Começamos a tocar em lugares legais e lugares também que não eram recomendados. Chegamos a tocar e dormir em casas de prostituições. Depois, cheguei a produzir o disco do Maurício Reis “O Poeta do Cravo Branco” que fez sucesso, hoje ele mora em Recife. A verdade é: tanto Os Diagonais como os Golden Boys gravaram muitos vocais. Foi aí que conheci o Tim Maia através do Cassiano.
O Roberto Carlos havia gravado e estourado uma música do Tim “Não Vou Ficar” – o Tim lançou o compacto “Primavera” de Cassiano e Silvio Rafael, que nós cantávamos em apresentações. Inclusive nos shows que fizemos pela Bahia, nós criamos um número em cima do Coronel Ludugero que era muito conhecido, do tipo de Genival Lacerda, que cantava forró e tal – o Camarão o imitava com a voz rouca. Então criamos a música que era “Coroné Antônio Bento” do Luiz Wanderley com o Camarão cantando e imitando o Coronel Ludugero, com chapéu de palha e tudo.
Então havia Os Diagonais e eu fazia uma participação no show cantando músicas que já haviam sido gravadas e o Maurício cantava músicas tipo “O Ébrio”, músicas do Carlos Alberto, essa coisas.
Enquanto viajávamos durante quatro meses, Os Diagonais estavam preparando um disco, onde várias músicas foram lançadas depois no primeiro LP do Tim Maia, inclusive “Coroné Antonio Bento” – tanto que no disco quem canta a segunda parte da música é o Camarão, o Tim não sabia a letra toda. Se você prestar atenção vai verificar que não é o Tim. Muita gente não sabe disso, passou despercebido e não tem crédito. Logo depois, eu tinha umas músicas, eu já flertava com a soul music. Já nesta época gravei a música chamada “Tentei lhe Esquecer” que foi uma das primeiras com som black, junto com Rosa Maria na Odeon, tocou bastante, foi o primeiro hit. Daí em diante eu quebrei aquela coisa que eu tinha com a Jovem Guarda, fui me distanciando, comecei a ver outro processo de composição, a coisa do vocal, a música negra.
– Como você conheceu o Tim Maia?
– Conheci o Tim no dia que ele estava gravando com Elias Regina. Mostrei uma canção para ele “Gioconda”, era um blues. Ele gostou da música, mas não do nome e pediu para trocar, alegando que o nome não era legal e que eu deveria trocar, chegou até sugerir Cristina. Acabou não gravando. Tempos depois, eu apresentei esta música para o Raul Seixas que era produtor da CBS e falou que era exatamente o que ele estava procurando para incluir no disco do Jerry Adriani, o que acabou acontecendo. Neste período eu assinava Hyldon Souza, só comei assinar Hyldon depois do primeiro disco. Quando encontrei o Tim pela segunda vez, eu já estava tocando com Toni Tornado. Cheguei a gravar também com Wilson Simonal, toquei guitarra quando ele estava no auge de sua carreira. Até com os The Pops eu trabalhei em vários discos, cheguei a colocar voz numa faixa.
– Quem descobriu Tim Maia?
– Quando o Tim foi produzir o Eduardo Araújo, o disco chama-se, “Boogaloo” saiu pela Odeon que tem no repertório “Não Vou Ficar”, a partir deste momento é que o Tim veio a fazer o seu compacto “Primavera’ lado A, o lado B “Jurema” – que durou oito meses para ser lançado. Isso tudo porque o André Midani não queria soltar o disco e só saiu porque o Tim, no desespero e passando fome, entrou na sala dele e deu um murro na mesa! Deve ter dado um estalo nele e acabou lançando e estourou. Hoje em dia muitos dizem que foi o André Midani que descobriu Tim Maia!
– Você chegou a produzir algumas coisas antes de lançar seu primeiro disco.
– O negócio é que o Gutti Carvalho havia sofrido um acidente na perna e ficou impossibilitado de trabalhar e ficou carente de produtor na Polydor. Fiz uma proposta para o Jairo Pires. Ele me deixaria gravar um disco, em troca eu produziria os discos da gravadora. Acontece que tudo que eu colocava a mão virava sucesso, eu caprichava nas produções. Produzi “O Som Bateau” de uma banda fictícia, “Os Caretas”, “Banda do Canecão” e “Turma do Pagode”, esses discos chegaram a vender de 100 a 150 mil cópias, era muito para época. Dos discos mais bem vendidos da companhia entre dez, quatro eram produzidos por mim. Produzi Erasmo, Diana, Wanderléa e todos os discos do Odair José da Polydor. Em “Pare de Tomar a Pílula”, sou eu quem toca guitarra com Azymuth. Tudo isso no espaço de 1970 até 1973. Até que chegou um dia que eu cobrei do Jairo a gravação do meu disco, ele respondeu que eu ainda não havia gravado porque não queria.
– As primeiras músicas que foram gravadas no seu disco?
– “Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda”, “Meu Patuá” que era a música que eu acreditava que ia estourar, e “Eu Gostaria de Saber”. Todos gostaram! Quando André Midani ouviu, falou que era a melhor produção que já tinha visto no Brasil, era uma novidade no mercado, dizendo que eu era demais. Uma semana depois, ele chamou o Jairo numa reunião e resolveram que eu ia gravar metade das minhas músicas e a outra metade de diversão. Eles queriam que eu gravasse uma música chamada “Angie”, eles achavam minha voz parecida com a de Mick Jagger! (risos). Eu pensei muito e decidi que não ia gravar e fiquei muito p…! Fui procurar o André Midani para brigar com ele! Os colegas me pegaram, e me lavaram para um restaurante para fazer minha cabeça.
Resultado: meu disco ficou quase um ano parado. O Heleno e o Jairo começaram a pressionar o André, pra ele soltar o disco. Neste tempo o Hélio Matheus me chamou para gravar em São Paulo, aproveitei e levei a fita para mostrar na RCA, o Osmar era o diretor na época. O Osmar chamou o Helinho e ridicularizou o trabalho. Voltei de São Paulo mais arrasado ainda! Chegou um ponto que eu estava tão bem na empresa que eles acabaram liberando.
– Lançaram “Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda”.
– Lançaram, mas da seguinte maneira: Vamos lançar que isso não vai acontecer nada mesmo e o cara vai continuar produzindo. Só que as rádios não é como hoje, os DJs gostavam de coisas novas. O Big Boy adorou a música e colocou no ar, a rádio JB foi a primeira que tocou. Ninguém sabia quem era eu, o compacto não tinha foto. Quando fui fazer as fotos eu já estava em segundo lugar nas paradas de sucesso do Brasil inteiro. Foi quando decidi gravar meu LP. O André disse que isso era sorte de principiante.
Do LP foi extraído “As Dores do Mundo” que foi a primeira música que tirou o Roberto Carlos do primeiro lugar em execuções em São Paulo. Vendeu o que equivalente nos dias de hoje um milhão, tudo isso sem divulgação.
O LP saiu, estourou “Na Sombra de uma Árvore”, “Acontecimento”, “Sábado e Domingo”. O compacto duplo que tem “As Dores do Mundo”, “Na Sombra de uma Árvore”, “Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda” e “Sábado e Domingo” é recordista de permanência na parada da NOPEN, perdendo apenas para “Dio Como Ti Amo”.
Depois disso fiquei muito revoltado com gravadoras e fui para os EUA deixando tudo de lado. O meu erro foi não pensar nas pessoas que gostavam da minha música e não ficar me torturando por causa de Andrés da vida, deixando interferir no meu trabalho. Depois lancei o segundo disco que era muito artístico, mas não era para tocar em rádios, tinha faixa de oito minutos, não existe uma música naquele disco que tenha algo parecido com “Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda” e as demais.
– “Hyldon ao Vivo” é seu primeiro registro ao vivo com imagens?
– Sim é o primeiro, há cinco anos venho recebendo propostas mas nenhuma que me agradasse e que me desse total liberdade artística. Isso em parte foi bacana pois permitiu que eu e a banda trabalhássemos os arranjos e adquiríssemos um som característico que só quando se toca bastante tempo com as mesmas pessoas acontece.
– Fale-me como foi feito a seleção de repertório do DVD.
– Descobri que pra eu ter prazer de tocar músicas antigas teria que ter uma motivação extra independente de ver e ouvir o público cantar minhas músicas, seria aliar meu lado de músico a essa história. Então quando vou para o show, sou como uma criança que vai para o parquinho brincar. Procuro colocar as canções mais conhecidas, é um show autoral, as vezes faço homenagem aos meus contemporâneos -Tim Maia e Cassiano, tocando Primavera por exemplo. Gosto de colocar algumas inéditas e músicas minhas gravadas por outros intérpretes como “Revanche” gravada recentemente pelo Léo Maia, filho do Tim Maia.
– Quem teve a idéia de gravar o show e lançar?
– Eu estava prestes a iniciar uma temporada numa casa do Rio, pequena e aconchegante. Era uma vez por semana e convidei um amigo pra cada dia. De repente me ligou o Roberto de Oliveira dono da RWR uma produtora de vídeo que tinha vários produtos entre eles as famosas caixas do Chico Buarque. Era uma segunda feira, o que me conquistou foi a proposta de qualidade e na Quinta-Feira já estávamos gravando.
– Sobre os convidados.
– São representantes das vertentes da soul music, apesar de eu não acreditar em rótulos pra música. Catra representando o funk mas no DVD canta “Velho Camarada”, música que gravei com Tim Maia e Fábio mostrando um outro lado, o romântico. Carlos Dafé um dos fundadores da Banda Black Rio dividindo comigo “Quando o amor chegar” canção que embalou Toni Ramos e Cristiane Torlone na novela Livre pra Voar de 1984. Bebeto representando o balanço samba-rock-soul, cantamos juntos “Sábado e Domingo”. Michael Sullivan amigo desde 1970 quando fizemos parte de uma banda chamada Os Selvagens, é o lado das baladas e escolhi uma canção que ele já gravou pela Som Livre que é “As Dores do Mundo”. Yasmin é minha filha e é ligada em hip hop, participa em “Brazilian Samba Soul”. Duas feras do rap brasileiro Marechal e Mc Gil fazem uma batalha de rimas de improviso e Serjão Loroza e Marquinhos “O Sócio”, dois convidados surpresas que apareceram num dos dias dos nossos shows, convidei para cantarem “Primavera” e eles deram um show!
– Vem coisas novas do Hyldon por aí?
– Tenho dois discos em formatação na minha cabeça. Um só de baladas e outro com, uma banda aquí do Rio, a Parafhernalia com alguns lados B da minha discografia. Sempre que posso pego minha guitarra e vou nos shows deles dar uma canja, só tem músico da pesada – Donatinho (filho do João Donato) que toca teclados na banda aparece com umas músicas de discos antigos que as vezes nem eu me lembro como “Estão Dizendo por Aí” e “Balanço do Violão”.
Shows.
– No Rio de Janeiro fizemos Canecão no dia dos namorados, Modern Sound que é uma das mais antigas lojas de discos do Rio e tem um espaço pra 400 pessoas, foi um show maravilhoso, casa lotada. Fiz o Centro Cultural da Ligth e o Teatro Rival. Estamos agendando São Paulo e se Deus quiser percorrer todo o Brasil, o Sul está em meus planos. Este show comemora 35 anos do meu primeiro álbum Na Rua ,na Chuva, na Fazenda (Casinha de Sapê)
Fonte: Jornal do Oeste (PR)