Boletos, com Hyldon & Trio Frito, um lançamento inteligente | UBC

Músico e criador vencedor do Grammy, diretor de distribuidor digital e compositor dão dicas práticas para fazer uma entrega com planejamento e mais chances de repercussão
boletos2

O banco de dados do Spotify recebe, sozinho, mais de 40 mil novas músicas todos os dias no mundo. É justo pensar que a soma das outras plataformas de streaming — YouTube, Apple Music, Deezer, Amazon Music — alcance coisa de centenas de milhares de canções. Como chamar a atenção do público em meio a tanto ruído?

Não há uma só resposta a essa pergunta nem, muito menos, uma fórmula. Mas gente que 1) já testou alguns modelos; 2) que vê uma multidão tentar fazer sucesso todos os dias; e 3) que percorre seus próprios e originais caminhos nos dá algumas dicas. São eles, respectivamente, o compositor, músico e professor Jacques Figueras, que tem dois prêmios Grammy na estante; o diretor da OneRPM no Brasil, Arthur Fitzgibbon; e o compositor, cantor, músico e produtor baiano Hyldon.

Faça do seu processo criativo um contínuo pré-lançamento

“A partir de quando eu devo começar a divulgar o projeto? Começa quando você o cria”, resumiu Jacques Figueras durante o webinar (seminário pela web) exclusivo que ele deu para os seguidores dos canais informativos da UBC no último dia 23. “Quando você começa a pensar no single, no EP, no álbum, já deve começar a falar disso para as pessoas. Concorremos com muita gente por atenção em redes sociais, no YouTube, no mundo físico e digital. Coloque o seu público o tempo inteiro dentro da coisa. Muito artista gosta de estar numa caverna, cercado de silêncio e paz para criar. Mas, hoje em dia, já não funciona sair da caverna meses depois e dizer “aqui o meu disco”. Periga não ter ninguém na entrada esperando. Vá mostrando pouco a pouco: o verso, a introdução, o refrão. É tendência mostrar coisa inacabada, hoje em dia, e dar ao fã a sensação de que ajudou a fazer aquilo.”

Crie um conceito para cada trabalho, não lance nada por lançar

“Todo e qualquer artista, grande ou pequeno, busca a maior exposição da sua música. Mas um bom e antecipado planejamento envolve técnicas de marketing, administração, identidade visual, pesquisa de mercado e muitas outras coisas”, enumera Fitzgibbon.

Hyldon concorda e sabe bem disso na prática. O craque, autor de “Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda (Casinha de Sapé)”, lança nesta sexta-feira (31), dia mais temido pelos assalariados, o seu novo single, “Boletos”. Com canções cheias de ironia, humor, temas cotidianos e política, brinca com a dificuldade de pagar as contas no último dia do mês. A entrega do trabalho ganha, assim, uma piada pronta que certamente despertará mais interesse no público. “Passei o ano passado gravando um álbum. Contei com parceiros comerciais na OneRPM, na UBC, na WarnerChappell editora, além da minha equipe de mídias sociais, para promover cada um dos quatro singles já lançados. Quando veio a vez de ‘Boletos’, pensamos em lançar na época do ano que mais os concentra: além das contas normais, agora tem IPVA, IPTU, matrícula do colégio dos filhos, a conta dos presentes de Natal, viagem de férias, e por aí vai”, ele se diverte. O álbum completo deverá ter sido todo lançado em abril. Por quê? “Porque a seleção do Grammy começa nesse mês. É bom ter bastante margem para trabalhar o lançamento com calma”, ensina.

Não tenha medo de usar e abusar das redes sociais

Na era da exposição, quem fica na sombra só vai conseguir isso mesmo: não ser visto. Use as redes sociais para promover continuamente seu produto, inventando formas originais de abordar um mesmo lançamento várias vezes. “A Anitta fez isso há uma no e pouco. Ao longo de 12 meses, fez o lançamento de um single por mês. E com muita, muita promoção de cada um deles”, destaca Jacques Figueras como um exemplo de sucesso na divulgação. Mas ele alerta: só faça isso no seu perfil profissional, entre seus fãs e seguidores, não entre os amigos pessoais. “O público que o segue quer é mesmo ser bombardeado com coisas sobre você. Os amigos, não necessariamente. Não vá encher o saco deles”, brinca. Fitzgibbon faz coro e ensina: “Você tem que saber o tamanho do seu público nas redes sociais e tentar se comunicar com 50% dele, pelo menos. Geralmente, isso ocorre com duas a três semanas de antecipação ao lançamento. Se alcançar essa taxa, terá um impacto muito maior e mais eficaz.” A lógica é simples e certeira: os próprios fãs se encarregarão de espalhar a palavra.

Entenda de uma vez o poder das playlists das plataformas

No passado, era a imprensa tradicional (que continua a ser relevante). Agora, a força maior está com as playlists. Aparecer nas playlists editoriais mais populares de plataformas como Spotify, Apple Music ou Deezer é um belo atalho para o sucesso. Mas não basta ir parar lá. É preciso entender como se manter. “No caso das playlists editoriais, feitas por editores das plataformas, é um jogo de funil invertido ou de bonecas russas. Você, primeiro, entra na playlist pequena. Se performar bem, vai subindo para uma maior, e assim sucessivamente. Quando está numa boa playlist, tem que divulgá-la absurdamente. Antes, divulgava a matéria de jornal em que saía. Hoje, é preciso divulgar a playlist usando suas redes sociais. O objetivo do artista é não só ficar numa playlist como conseguir ir para uma maior”, descreve Figueras.

A definição de boa performance passa pelos conceitos de skip rate (ou taxa de pulo para a próxima canção) e de play rate (número de audições). Quem consegue ter uma skip rate baixa e uma play rate alta se mantém na playlist e vai subindo posições até passar para as mais importantes, que, com centenas de milhares de audições todos os dias, dão não só uma visibilidade gigantesca como se traduzem em bons ganhos com direitos fonomecânicos e de execução pública.

Conheça ferramentas das plataformas e dos agregadores. Saiba que recursos existem nesse ambiente digital e opine, envolva-se

Se você usa um agregador ou distribuidor digital para colocar sua música na plataforma de streaming, mantenha uma estreita comunicação com ele. Conte sempre ao seu distribuidor quando fará um lançamento, com antecipação de pelo menos três semanas, para que, juntos, vocês possam trabalhar essa canção. Muitos agregadores têm boa entrada com os editores das playlists e podem tentar emplacar a sua música numa de novos lançamentos, por exemplo. “O prazo mínimo para essa preparação é de três semanas”, crava Figueras. E ele vai além: também é fundamental que o artista conheça ferramentas elementares das plataformas de streaming e saiba usá-las ao seu favor. Tanto Spotify como Deezer, só para ficar nas duas plataformas exclusivas de áudio mais populares do país, têm funcionalidades especificamente desenhadas para os artistas, nas quais se pode fornecer o máximo de informação sobre o gênero da música, o público ao qual se destina, até mesmo o tipo de instrumento usado naquela determinada obra. Tudo isso ajuda o editor da plataforma musical a encaixar sua música na melhor playlist possível.

Do ponto de vista técnico, há ferramentas simples que ajudam a difundir a música de uma forma rápida e efetiva. “Uma delas é o smartlink (um método de divulgação maciça das músicas em todas as plataformas sem precisar copiar link por link); outra, o pre-save”, afirma Fitzgibbon. O pre-save permite criar engajamento antes da entrega efetiva da música, mantendo o suspense e dizendo ao público tudo sobre a data e o modelo do lançamento, o que gera curiosidade. Está disponível, de graça, em alguns agregadores digitais.

Faça tudo isso depois de uma coisa elementar: criar um bom produto

Esta deveria, na verdade, estar abrindo esta lista. Parece óbvio, mas não custa lembrar que todo o marketing do mundo é incapaz de salvar uma música ruim. Ter os conhecimentos sobre como divulgar sua obra é um passo essencial nos tempos atuais, mas não deixe, jamais, de separar a maior parte do tempo para criar e lapidar sua criação. Entregue a melhor versão de si mesmo. “Com estes meus anos trabalhando com música, aprendi que não se vai muito longe sozinho e que, hoje, o artista tem que que estar antenado com as novidades mas sem deixar de compor e produzir suas músicas com sentimento e músicos do primeiro time. A divulgação, a distribuição e o marketing vêm depois. Sem conteúdo, a arte não vinga.”

Fonte: UBC