Hyldon afirma que discriminação minou o soul brasileiro: ‘A maioria era negra’ | Carta Capital

‘Na Rua, na Chuva, na Fazenda’ faz 50 anos e ganha nova versão, com alunos de escola de percussão quilombola…

Uma das músicas mais conhecidas do cancioneiro nacional completa 50 anos. Na Rua, na Chuva, na Fazenda – ou Casinha de Sapê – foi lançada em um compacto (hoje seria chamado de single) em 1973.

Hyldon conta que a última ocasião em que o abordaram e pediram autorização para gravá-la partiu de um grupo hebraico. Sem saber exatamente quantas vezes foi registrada mundo afora, ele lembra que Na Rua, na Chuva, na Fazenda recebeu versão na Finlândia e ficou seis meses nas paradas de sucesso naquele país.

O músico diz que a canção, ao longo desse tempo, se adaptou a vários gêneros e aqui no Brasil já foi lançada em ritmos do samba ao forró. “A única que não tinha era em samba-reggae”, afirma. Mas agora tem.

Para comemorar os 50 anos de lançamento, Hyldon gravou uma versão em samba-reggae com meninos da Escola de Percussão de Tijuaçu, localizada na comunidade quilombola de mesmo nome em Senhor do Bonfim, no interior da Bahia.

Foi no município que Hyldon passou parte da infância e recebeu influência de repentistas, do frevo, das festas de reis e de São João, onde a Banda de Pífanos de Caruaru sempre se apresentava.

Em uma visita recente a Senhor do Bonfim, ele deu uma oficina na escola no quilombo e resolveu convidar seus alunos para fazer a versão comemorativa, já disponível nas plataformas de música – no dia 27 haverá o lançamento de um videoclipe.

“Os moleques nunca tinham entrado num estúdio. Deu tudo certo. Maravilhoso. O astral da gravação! Eu sentado com o violão e eles ao meu lado”, lembra. Hyldon diz ter ficado impressionado com a qualidade musical dos alunos da escola quilombola.

Naquela década de lançamento de Na Rua, na Chuva, na Fazenda, Hyldon era ligado ao movimento soul no Brasil, que contava ainda com músicos como Tim Maia, Cassiano, banda Black Rio, Luis Wagner, entre outros. No entanto, o grupo nunca teve o reconhecimento devido na história da música brasileira, embora bons trabalhos tenham sido lançados nessa vertente musical, os quais influenciaram outros movimentos no País, como o rap.

“Tem a discriminação. A maioria era negra. A gente também não abria mão da parte artística, principalmente eu e Cassiano. O Tim (Maia) depois mudou isso, começou a fazer música para tocar no rádio. Mas a gente não gravava música para tocar no rádio. A gente gravava música de sentimento, como diz o soul”, afirma Hyldon. “O cara que teria que ser líder de nosso movimento era o Tim. Mas o Tim era um cara muito louco. A gente também era louco. A gente não soube valorizar esse movimento.”

“Em vez de puxar eu e o Cassiano quando ele (Tim Maia) estourou, ele virou um lobo solitário”, relata o músico, ressaltando que eles eram muito amigos. A amizade, porém, não transcendia para o palco, algo comum em outros movimentos musicais surgidos no Brasil, nos quais seus integrantes costumavam se apresentar juntos.

Ouça a entrevista de Hyldon a CartaCapital:

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