Rosana fala de novo álbum, dos haters nas redes e relembra assédios: ‘Deixei muita gente com raiva’
CANTORA LEMBRA PASSADO DE SUCESSO EXAUSTIVO E CONTA QUE SÓ NÃO LARGOU CARREIRA POR CONTA DE INCENTIVO DE LENY ANDRADE
A cantora Rosana: “Eu trabalhava de segunda a segunda, era toda semana Globo de Ouro, Xuxa, Faustão” Ana Branco.
Insondáveis são os caminhos pelos quais vai a vida de Rosana. Em 1987, ela tinha acabado de conhecer o grande sucesso com a gravação de “Nem um toque”, incluída na trilha da novela “Roda de fogo”, da TV Globo. Contratada pela gravadora Sony, ela preparava o repertório do seu LP quando alguém sugeriu que ela cantasse uma versão de “The power of love”, meloso hit da cantora americana Jeniffer Rush.
— Diziam que ia vender muito, mas eu não queria gravar ela… Eu falava: “Com essa letra, não dá!” — recorda-se a cantora. — Mas eles até já tinham feito um arranjo com o Lincoln Olivetti, misterioso. E aí veio o Claudio Rabello, que me chamava de deusa e era muito ligado em mitologia grega. Ele se saiu com aquela letra, que nada tinha a ver com a original em inglês.
Era “O amor e o poder” (do popular verso “como uma deusa”), canção com sabor místico/mitológico que vestiu a personagem Jocasta (Vera Fischer) em “Mandala”, novela que conquistou o Brasil, inspirou célebres paródias e nunca mais saiu do repertório de Rosana. Passados 35 anos, a artista se prepara agora para um novo sortilégio. Na verdade, para “Feitiço”, seu primeiro álbum em 20 anos, que sai em outubro pelo selo LAB 344 e foi antecipado semana passada pela faixa-título, uma “soul music clássica, orgânica” (como ela define), composta por Leoni e Cris Braun.
Produzido por Sergio Martins (também conhecido como Sergiopí), “Feitiço” trará uma série de composições novas, como “Setembro” (de Zeca Baleiro e Wado, uma balada no estilo clássico de Rosana, em dueto com Zeca) e “Wonder woman” (de Cris Delano, Alex Moreira e Gabriel Moura).
— “Wonder woman” fala da guerra que a mulher enfrenta desde os primórdios e que vai continuar enfrentando, porque o preconceito só aumenta quando ela reage e busca os seus direitos — acredita Rosana, que também mira com essa música o seu público LGBTQIA+. — Faço um trabalho emblemático, e essa faixa de público vai muito pelo emblemático. Eles já pensam como vão dublar a música, e eu adoro quando sou recriada pelas drags.
A cantora Rosana no clipe de “O amor e o poder”, em 1987 — Foto: Reprodução
VOLTA COM SULLIVAN
Rosana, que no dia 11 faz show de seus hits de novelas na Arena Cultural Fernando Torres, no Parque de Madureira, ainda leva para “Feitiço” a house music “Bem que te avisei”, um dueto com o filho, o trapper Davy Fiengo (“ele escreve muito bem e está montando um EP com um pessoal de São Paulo que é muito direcionado pro hip hop sério”) e “Um tempo pra nós dois”, parceria com Hyldon e, seu velho conhecido (e padrinho de Davy), da dupla Sullivan e Massadas, que compôs seus hits dos anos 80: “Nem um toque” e “Custe o que custar”
— A Rosana estava com as malas prontas para ir para Londres, onde ela dizia que enfim iam entender a sua arte, quando recebi a notícia de que “Nem um toque” tinha entrado na novela — conta Sullivan. — Ela é uma das maiores vozes do país, e se tivesse nascido nos EUA seria uma das maiores do mundo.
Os tempos do sucesso foram exaustivos para Rosana.
— Eu trabalhava de segunda a segunda, era toda semana Globo de Ouro, Xuxa, Faustão. Aliás, já fiz Faustão com a costela trincada, por causa de movimentos do balé. E, em seguida, viajei para o México para fazer o meu disco em espanhol — diz ela, que não escapou do assédio masculino. — Para sair das cantadas era muito, muito difícil, principalmente com pessoas que trabalhavam comigo. Eu sempre saí pela tangente, e deixei muita gente com raiva.
Veterano da bossa nova e da indústria fonográfica, Roberto Menescal produziu em 1993 um dos álbuns mais ousados de Rosana, “Gata de rua”. E atesta:
— Ela me surpreendeu, porque não mostrou apenas a extensão de voz que a gente já conhecia, mas um suingue que ela não utilizava. A Rosana veio com vontade de experimentar outros caminhos, inclusive jazzisticos.
Em 1997, ela pensava em largar a carreira quando, na gravação de um songbook de Djavan, encontrou a madrinha artística: a cantora Leny Andrade, falecida na última segunda-feira:
— Aí, daquele jeito dela, botando a mão na cintura, ela falou: “Você não vai parar, não, vou brigar com você! Você tem que continuar, você é uma cantora maravilhosa!”
E assim foi. Hoje, em seus shows, Rosana toca guitarra e piano, canta seus hits e até arrisca canções de louvor de Mattos Nascimento:
— Minha mãe faleceu quando eu era muito pequena, então comecei a sair da Igreja Católica, passei a ler muito sobre reencarnação e cheguei a uma filosofia oriental, o Xintoísmo. Por causa da minha crença cristã, depois fui conhecer alguma coisa evangélica e resolvi frequentar igrejas, como a Renascer, a Batista e, às vezes, a da Graça. Só na Pentecostal que não ainda não fui, os hinos deles são agressivos. Prefiro os louvores.
Agressiva, para a cantora, também tem sido a internet. É onde ela bate boca com os haters, que fazem bullying por não gostar das intervenções estéticas em seu rosto (“quando veem que tem reação, logo ficam com medo”), e onde circulam informações conflitantes sobre a sua idade — assunto do qual não fala.
— Deixa isso daí ficar misterioso — pede. — Acho que o motivo de toda essa confusão foi porque, quando comecei a cantar com meu pai, ele falou para todo mundo que eu era maior de idade, por causa do conselho tutelar. E eu tinha só 13 anos.
Fonte: O Globo